sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Do século das luzes (crítica literária)


          Despontou no mercado editorial uma obra como há muito não se via. No geral um romance histórico, que desfila dramas pessoais e guarda belas lições morais, mas por detrás desta bem conhecida configuração da literatura mediúnica guardam-se algumas jóias filosóficas: teorias sobre a história, a sociedade e a liberdade, que nos fazem lembrar os grandes clássicos de Emmanuel. Nada do mundo espiritual, nem vampirismos ou licantropia, magia negra e xamanismos ou qualquer destes atrativos da imaginação que abarrotam as estantes, desonrando conceitos sérios em paródias infantis redigidas em péssimo português.
         Do século das luzes, de Rafael de Figueiredo, é uma obra sóbria do começo ao fim. Simples, no melhor sentido da palavra, junta o virtuosismo literário à clareza que o torna acessível a todos os leitores. Uma obra com camadas, que comove pela narrativa, alimenta a curiosidade ou retrata uma fase pouco conhecida dos primórdios do espiritismo; ou um pouco de tudo isto junto.
         Mesmo o seu processo de redação traz peculiaridades dignas de nota. O autor revela no prefácio que o panorama geral do livro lhe surgiu em sonhos muito vívidos, e que inúmeros espíritos colaboraram para o seu desenvolvimento, de modo que é relativamente vaga a autoria espiritual.
         Uma outra característica que salta aos olhos é a presença de citações diretas de outros autores do período, algo incomum para o gênero psicográfico, e que no caso da obra de Rafael parece cair como uma luva. O desenvolvimento psicológico das personagens bate rigorosamente com o desenvolvimento da sociedade nas décadas que antecedem a Revolução Francesa, e os estudos feitos por elas a respeito de filósofos como Rousseau, Voltaire, Kant e Platão lançam novas e instigantes perspectivas sobre o papel deles na emancipação intelecto-moral da humanidade, sem o que o Espiritismo e outros avanços do século XIX seriam impensáveis.
         O livro revela também partes da vida e do caráter de Mesmer, com quem conviveram brevemente os protagonistas; incomoda pela descrição vívida dos terrores do Santo Ofício em fins do século XVIII e na pátria do progresso; arrebata a alma através do desenrolar da vida de Jean, santo anônimo como as figuras humildes e grandiosas de Emmanuel; transporta-nos, enfim, para a vida campestre e monástica da França absolutista, fazendo-nos conhecer bordéis e salões com tanta riqueza de detalhes que, não se tratasse de obra espirita, deveria garantir prêmios e títulos ao autor.
         Mas o que mais nos motiva a celebrar este livro é o fato de termos encontrado nele algumas das teses principais que defendemos aqui neste caderno virtual. De certa forma ele preenche uma das muitas pequenas lacunas que tentamos cobrir com um estudo histórico e filosófico do Espiritismo. As linhas de conexão entre o Iluminismo e o Espiritismo são aí evidentes. Os conflitos graves experimentados por intelectuais e almas nobres vinculadas ao catolicismo, tendo de rever muitas de suas posições fundamentais graças ao progresso realizado por aquele século, retrata perfeitamente a guerra ideológica ainda vivida entre o novo e o velho, a liberdade e a autoridade.
         Agradecidos, guardamos a esperança de receber outras obras tão ilustradas da mediunidade florescente de Rafael de Figueiredo.

4 comentários:

  1. Muito interessante. Quero ler esse livro.

    Será que acha na internet? Minha condição financeira atual não me permitiria comprá-lo.

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  2. Rafael,

    o livro é muito novo e por isso ainda guarda direitos autorais. Uma opção para não gastar com livros é sempre exigir de uma biblioteca que os compre. Tente levar esta requisição a um centro espírita dotado de uma biblioteca bem administrada.
    Abraço.

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  3. Interessante sua sugestão. Nunca tinha pensado nisso. No fim ajuda a biblioteca, satisfaz as necessidades do leitor e contribui ao autor com a compra do livro. Uma boa solução.

    Porém, eu sinceramente sou contra a postura dos direitos autorais. Claro que não e correto que outra pessoas venda os livros dele e ganhe dinheiro. Porém nos nossos tempos da comunicação onde qualquer conteúdo pode ser transmitido facilmente de graça pela internet eu acho que não faz sentido querer ainda tratar o conhecimento como um bem de consumo, restringindo ele a um grupo seleto com poder aquisitivo suficiente.

    Ainda mais se tratando de um conteúdo espiritual, não devia ser restringido pela matéria, a mensagem devia poder chegar aos que a desejam.

    Em nossos tempos certas instituições lutam pelo monopólio de informação que deveria ser livre. Deveríamos lutar contra essas instituições que não tem interesse na informação, mas em seu valor monetário.

    Claro que isso não significa negar reconhecimento ao autor, que deve receber por seu trabalho. Entretanto os que tem poder para adquiri-lo provavelmente o farão de qualquer modo, pois a versão impressa é sempre melhor. Já os que não poderiam ter a obra de outra forma, não faz diferença para o autor, pois se não conseguissem de graça não iriam comprar também. Por fim, tem um comentário interessante de um autor de literatura e quadrinhos chamado Neil Gaimam (autor de Sandman) que diz não se incomodar que copiem digitalmente sua obra e explica que as pessoas nunca conhecem um autor que admiram comprando os livros, mas sempre pegando emprestado ou conseguindo de graça, e que será a partir desse primeiro contato que vão admirar o autor e se esforçar para comprar livros dele, ou seja, o que parece ruim para o trabalho do autor é na verdade um benefício de divulgação para ele.

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  4. Humberto, Onde comprar o livro? Qual é a editora?

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