sábado, 18 de fevereiro de 2012

Mulheres Fascinantes: crítica literária



         O ano de 2006 viu nascer uma grande obra da literatura mediúnica, e que ainda não recebeu a devida atenção do público. Cirinéia Iolanda Maffei, autora que eu desconhecia até pouco, foi o instrumento perfeito para a materialização de mais uma obra de grande estatura do espírito Léon Tolstoi, ao qual me sinto particularmente atraído desde os contos recebidos por Yvonne Pereira.
         O que mais assusta em Mulheres Fascinantes: a presença feminina na vida de Jesus é precisamente o reencontro com o traço inconfundível de Tolstoi, tantas décadas depois dos inesquecíveis contos da grande Yvonne. A semelhança de estilo, temas e propósitos que o autor apresenta em ambas as médiuns, e não menos em sua obra em vida, já são motivos suficientes para despertar o interesse do estudioso espírita, mas é a força arquetípica dos quadros vividos, dos sentimentos naturalíssimos, das personalidades plausíveis com as quais imediatamente nos identificamos, pela energia e sinceridade com que Tolstoi reconstrói episódios evangélicos desconhecidos até então, que esta obra se revela, em nossa despretensiosa opinião, como peça da “literatura clássica” espírita.
         A mui inspirada Cirinéia foi medianeira feliz entre aquele vasto e profundo coração de gênio russo e a nossa alma sedenta de carícias espirituais, de reminiscências daquela estética sublime, mais psíquica do que plástica, que nos arrebata em Boa Nova, Paulo e Estevão ou Primícias do Reino. O lirismo cativante e a perfeição da escrita, elementos que parecem ter desaparecido dos numerosos volumes psicografados que abarrotam as prateleiras, se associam à simplicidade e desembaraço da linguagem, que em momento algum transmite o ar de afetação com que os autores ruins tentam colorir os seus textos.
         Cada conto é uma peça impecável de arte, diante da qual a imaginação e o juízo nada cogitam retirar ou acrescentar. Todos girando ao redor de existências que, à semelhança das de Paulo e Maria de Magdala, encontraram o seu divisor de águas num encontro com Jesus. Uns curados da mente ou do corpo, outros sentados anônimos na multidão, e até aquele que lhe pregou os cravos nas mãos. A maior parte transformada definitivamente para melhor, enquanto poucos, recalcitrando no crime e na loucura, tinham agravados seus débitos pela consciência adquirida no inesquecível encontro.
         Ao final de cada capítulo, interessante surpresa enriquece em muito a meditação sobre aquele conto. Tratam-se de depoimentos das almas que as protagonizaram, e que após o relato de Tolstoi vêm dizer de sua trajetória posterior aos eventos da Judéia e da impressão causada pelo encontro com Jesus, às vezes muitíssimo breve, mas sempre significativo.
         Com sua linguagem simples, lúcida e sublimemente sutil, Tolstoi nos conduz em cada conto, como se dirigisse nosso espírito das sensações fortes vividas pelas personagens em seus terríveis dramas aos píncaros da elevação nos seus encontros renovadores, de modo que o próprio leitor vivenciando a intensas transições emocionais é frequentemente levado a profundas comoções, reavaliando-se e retraçando na imaginação trajetórias semelhantes às retratadas. Será necessário ao leitor certo grau de insensibilidade para evitar ver renovadas as lágrimas a cada capítulo. E, ao entregar-se ao domínio de Tolstoi, o leitor se vê de tal maneira conduzido por elementos inconscientes, graças ao realismo das cenas e a forma direta com que apelam para nossa humanidade, que algum instinto latente parece confirmar por secreta intuição os fenômenos mediúnicos apresentados.